Doutores da Alegria


Parte do livro: Rir é o Melhor Remédio, que escrevi em 2006, com meus colegas de trabalho da faculdade quando cursamos Jornalismo, na Universidade São Judas Tadeu.

Doutores da Alegria
Mayara Vellardi

“Há pessoas tão alegres, tão meigas, tão felizes, que ao entrar numa habitação parece que lhe dão luz.” (Worl Beecher)

            Segundo pesquisas realizadas e divulgadas no livro de Morgana Masetti, Soluções de Palhaços, há muito o que contar. Para a abordagem com a criança, foram aplicados dois desenhos antes da atuação dos Doutores da Alegria e dois após o trabalho. Antes e depois do trabalho, pediu-se à criança um desenho de como ela se sentia no hospital e outro, sobre uma figura humana. Junto com esse pedido, iam sendo construídas as histórias que as crianças contavam à medida que desenhavam. Analisavam-se as diferenças de estilo, cores, formas, tamanho, em relação aos dois momentos. O intervalo médio de aplicação antes / depois foi de duas horas em 16 pacientes. Foram analisados 90 desenhos: 68 do grupo pesquisa, com a intervenção dos palhaços e 22 sem a intervenção destes. Os resultados são perceptíveis. Na opinião de um médico, o sorriso pode ser o indicador de uma melhora no estado clínico. O médico que valoriza isso dá um melhor tratamento.
            Já a mudança de comportamento das crianças é o resultado mais marcante do trabalho dos palhaços. Em muitos casos, essas mudanças eram importantes. Crianças que estavam prostradas se tornavam mais ativas. As quietas passaram a se comunicar mais. As que choravam passaram a sorrir e também a se queixar menos de dores. Melhora e/ou aumento de contato e colaboração com a equipe e com o tratamento médico foram dois aspectos significativos. As crianças passaram a se alimentar melhor e a aceitar mais as medicações e exames.                                    
       Segundo os profissionais há também uma melhoria na imagem da hospitalização em si. Modifica-se a percepção do hospital como um ambiente hostil. Diminui a ansiedade da internação. Alguns profissionais associam a atuação dos Doutores da Alegria a uma aceleração da recuperação no pós-operatório.                         
      Os profissionais acreditam que o sorriso funciona como um importante indicador de recuperação física, porque ajuda a diminuir a ansiedade e torna os pais e as mães mais confiantes na equipe e no tratamento. Observam ainda que os pais ainda passam a ser mais ativos no processo de recuperação dos filhos, aceitando melhor a hospitalização e percebendo-a de forma mais positiva.                                                                         
           Notou-se a diminuição do estresse na rotina hospitalar, facilitação do trabalho pela melhora do contato com as crianças, pais e profissionais. Houve uma melhoria da imagem do hospital e uma mudança de comportamento dos profissionais, que passaram a sentir-se mais dispostos para o trabalho.                                                        
          Dá para perceber como esse trabalho é importante só pela opinião de uma mãe: “Ver meu filho contente, me deixa contente. Hoje até eu estou sorrindo”.
            A melhoria da expressão das crianças durante a internação é o ponto mais marcante da atuação dos palhaços. O trabalho dos Doutores da Alegria promove uma mudança de comportamento facilmente percebida pelos pais e mães. Tal como no relato dos profissionais entrevistados, eles observam que as crianças começam a falar mais, a brincar, a se alimentar e a expressar a expectativa de que os palhaços voltem. Observam também que a criança passa a encarar a hospitalização de uma forma mais positiva.                  
              Percebe-se diminuição da ansiedade em relação à internação, melhoria no cuidado com os filhos hospitalizados, alteração na imagem do hospital: “Ver meu filho sorrindo, mesmo que doente, é bom, em vez de vê-lo apenas tomando remédio”. (Comentário de uma mãe).                           
            Para os pais e mães, a mudança observada nas condições emocionais da criança, a partir da atuação dos palhaços, é um determinante significativo em sua própria condição emocional. “Fiquei mais alegre por vê-lo feliz, isso me deixou mais tranqüila”. (Comentário de uma mãe).
            “Do personagem menino que morre, ao super-homem que o salva do gigante”. (Desenho de criança). O grupo de pesquisa apresenta de três a quatro vezes mais alterações que o grupo de controle. A alteração mais presente é a modificação do conteúdo das histórias contadas após a situação dos palhaços. Observa-se um enriquecimento de conteúdo, enredos positivos ou de final feliz e uma maior expressividade de conflitos. Outras alterações importantes foram: aumento no tamanho de desenhos , maior uso de cores, mais nitidez ou aprimoramento nas formas. Todas essas alterações indicam que, de alguma forma, houve uma expansão de movimentos da criança e de sua forma de se posicionar diante da hospitalização.                                                                               Esses dados mostram-se em concordância com os depoimentos de pais e mães, médicos e enfermeiras. Por meio dos desenhos, constatamos uma maior expansão motora e emocional das crianças, expressas pelo aumento das formas, mais uso de cores e melhor resolução das histórias.        

Fatos Marcantes

No livro Soluções de Palhaços de Morgana Masetti, há lindos depoimentos vividos pelos Doutores da Alegria. Uma história marcante foi vivida por Raul Figueiredo que interpreta o Dr. Zappata Lambada. – Uma paciente, de um ano e meio, havia passado por um transplante. Estava na UTI, muito deprimida, e não reagia a nada. Fomos atendê-la como de costume, sem saber do acontecido. Ela estava semi-adormecida e então começamos uma serenata. Aos poucos ela fixou o olho em nós, dando de vez em quando umas olhadelas para sua mãe, de quem logo tirei um ovo de cabelo. Ela pegou o ovo, abriu-o e viu dentro dele um filhote de passarinho a quem ela apanhou delicadamente com um olhar doce. Deixei o bichinho aos seus cuidados. Terminada a “consulta” a mãe pediu que ela nos desse tchau e mandasse beijos, no que foi prontamente atendida. Logo depois ela nos confidenciou que aquela era a primeira reação dela depois da cirurgia. Falamos sobre o caso com a psicóloga e ela pediu que auxiliássemos no tratamento. Sentimo-nos lisonjeados com o convite e desde então passamos a acompanhá-la em todas as dependências do hospital onde ela era conduzida.”      Vera Abbud interpreta a Dra. Emily e ela contou sua história também. “Estávamos terminando uma rotina com a paciente, quando a enfermeira veio colocar o soro. Ela pediu para que eu segurasse a sua mão e começou a berrar durante as várias tentativas frustradas de tentar achar sua veia. A enfermeira desistiu, Graças a Deus, a pequena estava sofrendo muito. Então pediu que a colocasse em pé. Ajudei-a  a calçar os sapatos e, quando ela se sentiu pronta, falou, como se nada tivesse ocorrido: “Faz mais bolha”! E assim nos transportamos para uma realidade mágica e voltamos a brincar. É muito bom sabermos que podemos proporcionar isso.”                 Thaís Ferrara interpreta a Dra. Ferrara também conta um fato marcante. “Trabalhando com o Dr. Lambada, visitamos uma paciente que havia sofrido um grande trauma. Ela não falava, e tínhamos dúvida sobre se ouvia. Era uma situação confusa e, na nossa santa ignorância, fomos tateando, buscando uma forma de comunicação. A música nos pareceu um veículo bem aceito. Fizemos a brincadeira do “atirei o pau no gato”e, em vez do “miau”, vinha sempre um cacarejo ou um relincho. Ela estava alerta e na terceira vez em que cantamos, veio em meu socorro: bem pertinho do meu ouvido, moveu os lábios. Menos pelo sussurro e mais pelo ar expirado, entendi um “miau”. Final feliz. Acertei finalmente a música e fomos embora, sob o olhar eufórico da fisioterapeuta, que nos disse ser a primeira vez que ela se concentrava em relação de estímulos por mais de alguns segundos. Na visita seguinte, a mãe dela pediu para ela nos contasse o que havia acontecido desde o nosso último encontro. “Voltei a falar”, disse ela. Descobrimos que ela e uma amiga tinha sido atropeladas, a amiga morrera na hora e ela perdera a fala.”                                           Fernando Escrich, interpreta o Dr. Escrich, também deixa sua história marcada. “Gostaria de relatar aqui o caso de uma paciente de 11 anos, que se encontra internada na Semi. Trabalhamos muito com ela no ano passado e temos um carinho muito especial dedicado a ela. Quando voltamos nesse ano percebemos que ela teve o braço amputado, o que a princípio nos abalou por alguns minutos, mas bastou ficar ao lado dela por mais alguns minutos, para olharmos a situação de uma outra forma. Ela tem tanto carinho e afeição pelas enfermeiras, assistentes e médicos que cuidam dela, que isso parece deixa-la mais forte para enfrentar esse momento tão difícil. Pode-se notar isso pelo cuidado que essas pessoas têm em deixa-la mais bonita, penteando seus cabelos e passando batom na sua boca. Ela é realmente linda. Outro caso foi de um paciente, de 7 anos, que sofreu um transplante de fígado e está na UTI. Tivemos duas visitas em que ele se relacionou muito com a gente, o máximo que pôde é claro! Mas depois do dia 20, ele estava sempre sedado, mas mesmo assim fizemos algumas serenatas pra ele. Espero que ele esteja gostando da seleção de músicas.”                                                                                       Cleber Montanheiro, que interpreta o Dr. Krebs Croc, abrilhanta ainda mais essas histórias emocionantes. “Esta semana, identificamos em muitas crianças a presença de um vírus pouco conhecido pela nossa equipe de besteirologistas – o “Bobovírus”. Listamos abaixo alguns sintomas apresentados pelas crianças nas quais ele foi encontrado. Riso contínuo: a criança dispara a rir sem controle da situação. Gritite: tendência das crianças gritarem ao mesmo tempo. Falatite: intervalos falados, que vão diminuindo até que elas disparam a falar, desenvolvendo em seguida a gritite.  Detectamos ainda uma predisposição do “Bobovírus” a ser transmitido pelo ar. Muitas mães começam a rir logo depois do início do tratamento por nossa equipe.”                                                  Pedro Pires, interpreta o Dr. Dog, também acrescenta um fato interessante. “Um paciente está internado há bastante tempo no terceiro andar. Ele tem estado muito fraco esses dias, sofrendo um bocado. Num destes dias, tinha mudado de quarto. No início deste dia, não queria nem que entrássemos, a Dra. Florinda e eu. Devagarzinho conseguimos ir entrando. Ele estava sozinho, gemia muito de dor, e por todo o tempo que estivemos lá não sabia muito o que fazer. Então apelei ao gesto mais básico de um ser humano que vê o outro sofrer – o carinho. Passei a mão em sua cabeça por um bom momento e ele aos poucos foi se acalmando, parando de gemer e, me pareceu descansando. Naquele momento deixei de ser o clown que bate a cara na porta para fazer rir, para me transformar no clown o mais humano possível. É um momento que sempre guardarei comigo. “Eu sou um palhaço e faço coleção de momentos”.(Heinrich Böll – opinião de um palhaço).”
Carla Candiotto, interpreta a Dra. Carmela Caramela, contribui com uma história comovente. “Aconteceu um fato que me emocionou profundamente. Foi com nossa amiga, que está no hospital há mais de um ano, devido a um problema muscular que a impede de mover qualquer parte do corpo. Eu e o Dr. Zequim estávamos tocando música e fazendo bolhas para ela, como de costume. Na hora de partimos, ela olhou para nós e movimentou os músculos da boca, formando um sorriso. O Dr. Zequim não a conhecia muito bem, e não podia imaginar há quanto tempo eu vinha esperando por aquele momento. Faz um ano que trabalho com ela, e seu rostinho sempre teve a mesma expressão. Considero esse fato uma de nossas grandes vitórias. Imagino que para ela, que é uma guerreira, foi um momento especial.”                       Soraia Saide, interpreta a Dra. Sirena, e ela conta algo muito marcante, através de suas experiências. “Estávamos brincando com um paciente de 7 anos, quando a enfermeira entrou para medir a febre das crianças e comentou com a sua mãe que ela era uma criança triste que seria um adulto triste. E a mãe concordou! As “doutoras” ficaram indignadas. Ninguém é triste! E começamos a desinfetar com bolhas de sabão a área da cama dele. Descobrimos que o pato dela falava pelos cotovelos, e a Dra. Caramela extraiu a língua de seu cotovelo. Ele sentou-se na cama e nos ajudou a operar o pato, quer tinha sapos e lagartixas na barriga. Na semana seguinte, durante uma briga entre as duas “doutoras”, ele contribuiu para a discussão com as seguintes frases: “Sua batatinha frita! Seu bife estragado!” Ele interagia e brincava com outras crianças. Não existe criança triste, existe criança sem estímulo.”
José Afonso Nereu, interpreta o Dr. Zequim, que também colabora com seu fato vivenciado. “Destes dias separei um caso para relatar, que foi vivido com a Dra. Ferrara. Um caso que trata da importância da maturidade e da paciência que um Doutor da Alegria deve ter dentro de um hospital. Foi isso o que experimentamos com uma meninona de 12 anos, bem disposta, mas que não estava nem aí pra gente. Tentamos de tudo e nada. Estava mais interessada em conversar com sua irmã sobre o que passava na TV do que na gente. De vez em quando, nos olhava para ver se ainda estávamos lá. Confesso que essa situação não ocorre com freqüência, e talvez seja a mais difícil de se lidar. Estamos preparados para o “sim vocês podem entrar”, e para o “não, eu não quero vocês”, mas esse “tanto faz” pode ser dolorido. Para evitar a dor, relaxe, aceite, faça esse exercício de dasapego ao ego, sem ansiedade, com generosidade. Saia do quarto e ria, ria de você. V. estava em outra, pronta pra ir pra casa. Dra. Ferrara saiu do quarto e riu e eu a acompanhei.”
Camila Bolaffi, interpreta a Dra. Raimunda Gabriel, e com a história que viveu, vai colaborar com os outros depoimentos. “ Uma criança com quem tive bastante contato esse mês foi um garoto. Mas, por algum motivo estranho, nunca conseguira entrar no quarto dele. A porta parecia aberta, só que quando eu ia entrar, “BANG”, dava com o nariz no vidro! E não é que o pestinha ria, ria, ria. Aí, quando eu me dava conta, estava dentro do quarto. E quem disse que eu conseguia sair! Quando finalmente saímos de lá e fomos entrando no quarto logo à frente,nem podíamos imaginar que os bebês estavam tomando banho. Só nos restou entrar na dança, fazendo bolhas e cantar: “Tomo um banho de lua...Que tal nós todos numa banheira de espuma...”                   Alexandra Golik, interpreta a Dra. Florinda Jardins, e conta uma fato interessante. “A primeira coisa que uma paciente disse, quando nos conheceu, foi: “Vocês são mentirosos!” Ficamos atônitos, mas começamos a fazer nossas rotinas com as outras crianças. Aos poucos, foi se aproximando e observando o que acontecia. Na visita seguinte, pescamos um sorriso dela, quando nos viu. Quando percebeu que havíamos notado sua reação, fechou imediatamente a cara. De novo preferimos trabalhar indiretamente com ela, por meio das outras crianças. Na terceira visita, mal entramos na enfermaria, Ela veio até nós. A partir daí, criamos um ótimo relacionamento. É engraçado notar sua idéia de que éramos mentirosos. Acho que queria dizer-nos que nunca seria possível divertir-se num hospital. Felizmente pudemos mudar a sua percepção.”
Paola Musatti, interpreta a Dra. Manela, e também tem uma bela história a acrescentar. “Entramos no seu quarto: Manela e Sirena. Eu ainda não o conhecia e então ficamos nos apresentando. Era um quarto bastante escuro e o menino (aproximadamente 12 anos) tinha um aspecto físico nada agradável, e a sua mãe, apesar de não estar na cama, enferma, era como se estivesse. Eis que no meio do “bate papo”- ele era realmente muito esperto – ele pede para que sua mãe o abrace e vai seguindo a conversa. Ele nos dominou na sua imaginação. Voamos alto com suas idéias, ajudando na sua fantasia, encadeando uma na outra, mas ele sempre pedia (e sua mãe lhe dava) carinho-toque. Uma cena de amor. Ás vezes pegava sua mão e comparava o tamanho com o de sua mãe e então entrelaçavam-se numa dança de rei e rainha, de nobreza. É essa a palavra: nobreza. Esse menino me mostrou, nesses seus atos, que há sempre algo por atrás do que vemos: que necessitamos enxergar. Ele desmontou meus conceitos e pré-conceitos que fazemos apenas pelo que vemos e não pelo que temos: SOMOS. Aos sair, comentamos: ele é um príncipe.”
Ângelo Brandini, interpreta o Dr. Zorinho, e assim como seus colegas também tem algo a contar. “Tivemos um momento de muita tristeza no último plantão a que esse relatório se refere, um paciente com um pouco mais de 1 ano, era nosso conhecido há poucos meses , gostava muito de bolhas e prestava muita atenção na gente. Nesse dia chegamos para começar o trabalho e fomos informados que ele estava entrando em óbito. Não tivemos coragem de entrar no seu quarto naquele dia. Foi impossível esquecer o que estava acontecendo com nosso amiguinho, mas não dava pra deixar a peteca cair, o show tinha que continuar. Quando terminamos o trabalho no andar ele tinha acabado de falecer. Naquele dia o paradoxo entre a vida e a morte foi mais presente do que nunca.”
Wellington Nogueira, interpreta o Dr. Zinho, e conta uma história alegre para fechar com chave de ouro. “Uma das maiores sensações de alegria nesse trabalho vem da capacidade que alguns jovens possuem de reverter seu quadro clínico, quando praticamente tudo vai contra eles. É o caso de um menino (9 anos), que caiu até a laje de sua casa, enquanto brincava, sofreu afundamento de crânio, ficou em coma, saiu de coma, foi para um quarto normal, começou a superar as seqüelas (perda de visão e fala), teve uma recaída, voltou para a UTI, encarou três paradas cardíacas. Mesmo assim, generosamente ele nos recebe e permite que nossas “receitas de bobagens” sejam embaladas por momentos inesquecíveis de riso e alegria. Só para citar um exemplo, em nossa última entrevista a ele, na UTI infantil, submetemos sua avó a um teste de personalidade”. Colocamos uma galinha de borracha em seus braços e dissemos: “Vamos contar até três e a senhora pode deixar caria a galinha.” Contamos até três. Ela deixou a galinha cair, e nesse exato momento, Dr. Zinho com toda a firmeza constatou: “Ela soltou a franga!”. Ele riu a ponto de gargalhar; nossa cumplicidade, mais uma vez vinha á tona! A partir daí, por sugestão do próprio paciente, testamos todas enfermeiras e auxiliares presentes na UTI infantil. O teste hoje é um grande sucesso em todos os hospitais e ele, acabo de saber, recebeu a tão merecida alta e está em casa agora novamente. Grande garoto!”                                      

História e Curiosidades

A supervisora de projetos dos Doutores da Alegria, Daiane Carina, trabalha desde 2000 com essa ONG e tem muito o que contar. Trabalha no Centro de Pesquisa e Desenvolvimento como supervisora de projetos. Ajuda na elaboração, planejamento e execuções dos Projetos da organização. Já presenciou diversas vezes o trabalho dos Doutores da Alegria pessoalmente.                   Começou a fazer parte dessa           ONG através de uma agência de empregos. Naquela época o Wellington (fundador) estava precisando de uma assistente de diretoria e disponibilizou a vaga nesta agência. Então concorreu a vaga com outras candidatas e foi selecionada.
Para se tornar um Doutor da Alegria é necessário ser ator profissional, com especialização na arte do palhaço e técnicas circenses. A rotina dos profissionais é feita em dupla, onde todos têm uma rotina própria, mas todos tem um itinerário que deve ser seguido, além de procedimentos de higienização. Cada dupla tem 1 dia na semana para trabalhar alguma habilidade artística, ensaiar, enfim levar repertório artístico para o hospital.
Os Hospitais atendidos em São Paulo são: Hospital do Campo Limpo; Hospital da Criança;
Hospital do Mandaqui; Hospital Santa Marcelina; Instituto da Criança; Itaci e Hospital Geral do Grajaú. Já no Rio de Janeiro são: Hospital Municipal Jesus e IPPMG. E em Recife são: Hospital Barão de Lucena; Hospital das Clínicas e Hospital da Restauração.                                                  A história dos Doutores da Alegria, começou em 1986, quando Michael Christensen, um palhaço americano, diretor do Big Apple Circus de Nova Iorque, apresentava-se numa comemoração num hospital daquela cidade, quando pediu para visitar as crianças internadas que não puderam participar do evento. Improvisando, substituiu as imagens da internação por outras alegres e engraçadas. Essa foi a semente da Clown Care Unit™, grupo de artistas especialmente treinados para levar alegria a crianças internadas em hospitais de Nova Iorque.
           Em 1988 Wellington Nogueira passou a integrar a trupe americana. Voltando ao Brasil, em 1991, resolveu tentar aqui um projeto parecido, enquanto ex-colegas faziam o mesmo na França (Le Rire Medecin) e Alemanha (Die Klown Doktoren). Os preparativos deram um trabalho danado, mas valeu: em setembro daquele ano, numa luminosa iniciativa do Hospital e Maternidade Nossa Senhora de Lourdes, em São Paulo (hoje Hospital da Criança), teve início o programa.
            O trabalho é gratuito para o público, mas não é voluntário. Ele se mantém com doações de empresas, parcerias com o Governo, através de leis de incentivo fiscal, e de sócios mantedores. Algo que é importante deixar claro, os Doutores da Alegria não pedem doações em faróis de trânsito, transporte coletivo, em universidades, ou de casa em casa. Há diversas maneiras de contribuir, para saber mais detalhes é só acessar o site: www.doutoresdaalegria.org.br.                                 A equipe é formada por profissionais de teatro, circo, música ou dança, mas todos especializados na linguagem do palhaço. A partir da seleção recebem treinamento de um ano para adequar seu repertório artístico ao universo hospitalar.
Os palhaços estão constantemente se aprimorando. O Hospital é um lugar de situação limite, que exige domínio da técnica do improviso e habilidades que enriquecem a interação com a criança. O Núcleo de Formação, Pesquisa e Desenvolvimento documenta, pesquisa e fortalece a linguagem do palhaço assimilando sua qualidade transformadora e abrindo caminhos para atuação além dos hospitais. Há um acervo de livros, artigos, teses, filmes sobre humor e saúde, grupos de palhaços que atuam em hospitais e jovens aprendizes.                                                                      Apresentam palestras para empresas e escolas. A vocação é uma formação natural dos Doutores da Alegria. Possuem uma grande formação de cenas, a partir do trabalho direto do hospital e da reflexão sobre ele, que resulta em espetáculos para adultos e crianças. Além do encontro promovido entre diversas escolas e gerações de humoristas no Palhaços da Madrugada.

Sucesso Comprovado

A psicóloga Morgana Masetti com sua experiência e estudos, comprova em seu livro Boas Misturas, que o sorriso é um fator muito importante para o contexto hospitalar. E segundo as informações presentes no livro, há fatores de sucesso no trabalho dos Doutores da Alegria realizado nos hospitais. O mais evidente é a utilização do humor e da brincadeira como recurso e linguagem de contato. Além disso, eles são capazes de estabelecer uma boa comunicação e contam com um sistema específico de crenças e valores sobre o que acontece dentro do hospital. Uma crença muito forte, por exemplo, é a de que, por mais grave que seja o estado clínico da criança, há uma essência que deseja brincar. O palhaço está familiarizado com o inusitado, ele vive no absurdo sem tentar organiza-lo, mas sabendo que se ele for capaz de olhar, ouvir, estar presente, a relação naturalmente se organizará. E organização para um palhaço, é aceitar o resultado que se apresenta sem julgamento de valores, mas com o desfecho possível. 
            Morgana Masetti também explica o que ocorre no ambiente hospitalar. O palhaço por trás de todo o barulho e confusão que possa fazer, silenciosamente, nos confronta com questões pouco confortáveis do tratamento: a marca que o envolvimento pode deixar – o que extrapola a questão da sobrevivência ou não do paciente – quando existe a coragem de se colocar integralmente nas relações. O palhaço lembra que a qualidade das interações terá impacto nos resultados do encontro. Se elas forem movidas nas relações alegres, a orientação será no sentido da vida e da saúde. Se forem movidas pela piedade e submissão (paixões tristes), se voltarão para a doença. O palhaço circula como um exemplo vivo dessas possibilidades, questionando despretensiosamente alguns valores do hospital.
            Segundo Masetti, o sorriso sinaliza que paciente e palhaço percorreram uma situação de dificuldade e sofrimento, e a ultrapassam, capazes de transforma-la, ao gerar intimidade e uma outra percepção sobre os fatos. O sorriso é um indício de que a vida cabe dentro de um meio asséptico. É um fator de recuperação, porque leva ao aumento de potência e a uma conduta ativa quanto à situação vivenciada.
            Esse ganho de potência, de ação, de viver os encontros e a saúde, surpreendentemente acontece no momento em que se abandona a realidade na forma como ela se apresenta, o que significa abrir mão da busca por explicações razoáveis para os fatos. Vem da possibilidade de abrir espaço para viver cada acontecimento sem sustar seu fluxo. É essa percepção, essa coragem que se liga ao conceito de Winnicott, para quem a saúde implica o sentimento de que a vida vale a pena (1996), e a oportunidade de recuperar a sensação de continuidade de existir (1990). Só o viver é criativo fortalece esse sentimento; é ele que preserva algo de pessoal, de secreto, alguma coisa que apenas uma pessoa, individualmente, pode fazer, à sua própria e tão particular maneira.
            Para finalizar, a psicóloga conta em seu livro, Boas Misturas, que esse modo de viver só é viável se abrimos espaço para o imprevisível, o inexplicável, o desconhecido de cada relação. Mas, para isso, é fundamental não ter pressa de preenchê-la com uma organização lógica ou com o tempo cronológico. Espinosa diz: O conhecimento não é a operação de um sujeito mas a afirmação de uma idéia da alma: não somos nós que nega ou afirma algo de si mesma. Difícil? Sim, mesmo para artistas que decidem ser palhaços. Porque antes de tudo, não se trata de ser presenteado com um dom ou alguma capacidade mágica. Como o cirurgião, o palhaço, também aprende a sua arte.   

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